Por Ísis Pereira
No meio da cidade existe uma rua. No meio desta rua tem uma casa, e a cor dela é azul. Não sei o significado de escolha da cor, seriam tantas interpretações! O que fica é que a casa é azul e dentro dela transitam pessoas de várias cores, o que torna tudo mais bonito. A casa funciona como um balé sincronizado ao som de remix de música contemporânea.
A CazAzul se movimentou na última quarta-feira, 1º de maio, Dia do Trabalhador, em torno do espetáculo Curta Cuarta. Na sua 3ª temporada, o projeto idealizado pela própria CazAzul trouxe as vistas do público a temática “Teatro dá trabalho”. No fundo da casa, o espetáculo começa com as luzes apagadas, talvez numa mensagem de que na escuridão atual da sociedade moderna, o teatro se revele como uma luz, como um farol a indicar rotas.

Já de inicio, o palco é iluminado pela desenvoltura de Adriana Amorim. Com referência na didática do Teatro do Oprimido, a professora levou o público a uma prática de gestos, toques e ações na busca de interação com o outro e compreensão de si mesmo. Os jogos de Boal tiveram o objetivo de “fazer com que a gente ouça aquilo que escuta, e veja o que a gente olha”.

O grupo Apodío, conduzido por Suzana VilasBoas, encenou “A máquina”. Um ato que contemplou toda a dicotomia do mundo moderno onde situações de opressões e preconceitos são cotidianas. O biotipo físico, a cor da pele, a forma de estar vestido/a, etc, revelam-se como “requisitos” de aceitação e empecilhos da promoção de igualdade entre indivíduos, que vivem geograficamente perto, mas humana e socialmente distantes. Além da dificuldade de transformação do padrão vigente, a participação do público na atividade mostrou a disposição para provocar mudanças. Em tempos de trevas, todo aquele que se move do seu lugar em prol do outro é luz.

Resistir e transformar são as propostas que ficam após assistir ao vídeo “Augusto Boal e o Teatro do Oprimido”. Iniciado no Teatro de Arena, o diretor e dramaturgo, Augusto Boal, deu ao teatro brasileiro e latino americano a missão de analisar conflitos e ser ativo na apresentação de alternativas.

A afirmação de Boal que o teatro é de todos e para todos pode ser considerada simplista, mas não utópica. A preocupação em traduzir a realidade plural e os conflitos de classe do país em uma linguagem acessível, dão à produção de Boal um lugar inquestionável de destaque e uso na luta para transformação da sociedade.
O segundo filme exibido na noite, o curta-metragem argentino “El empleo” traz uma reflexão pertinente sobre o capitalismo e exploração do homem pelo homem em seus apenas 7 minutos de duração. A excessiva produção de bens, proveniente da venda da força de trabalho da classe trabalhadora, resulta numa sociedade que se auto consume, se auto escraviza. A alienação da consciência coletiva reforça as manobras políticas de precarização das condições de trabalho e aprofunda as diferenças sociais e econômicas entre os indivíduos de uma mesma sociedade.

Sorteados entre o público e dirigidos pelo ator Vicente di Paulo, os participantes atuaram na leitura dramática de “Exceção e a regra” de Bertolt Brecht. A cena que discorre sobre o julgamento da morte de um indivíduo no desempenho de sua função, reforça o desfavor gritante associado à condição de trabalhador.

Christian Bispo e Davi Scandurra foram os responsáveis pelo pocket show, último ato da noite. Embalada por voz, violão e piano a plateia foi de suspiros a palmas.
Numa noite em que atores e produção moveram-se freneticamente para oferecer arte e conhecimento aos presentes, é mais que comprovado o tema “Teatro dá trabalho”.
** Texto por Ísis Pereira
Jornalista
** Fotos por Tamires Pereira